Desde que comecei a trabalhar em casa com meus deliveries, vira e mexe ouço a mesma pergunta: “Mas você está trabalhando?” Isso acontece mesmo depois de eu ter acabado de explicar que trabalho com delivery de comida, de dentro da minha casa.
Além disso, frequentemente recebo links de vagas de emprego, concursos públicos ou até ofertas para ajudar no negócio de outras pessoas — muitas vezes sem nem me consultarem antes. É como se eu estivesse desocupada o dia inteiro apenas por estar em casa.
Crenças e raízes limitantes
É surreal como o trabalho feito em casa ou manual ainda não é reconhecido como trabalho de verdade. Arrisco dizer que, para alguns, nem sequer é considerado um ganha-pão. Muitas pessoas reagem como se eu estivesse passando por alguma necessidade financeira, mesmo sem eu ter pedido ajuda nesse sentido.
Acredito que isso ocorre porque seguimos uma cartilha enraizada na sociedade: terminar a escola, entrar na faculdade, trabalhar durante os estudos (caso você não seja herdeiro), se formar e só então “vencer na vida”.
Porém, vencer o quê? O que é vitória para uns, pode não ser vitória para outros. Muitas vezes, enquanto nos esforçamos para estudar e trabalhar ao máximo, a vida vai passando. Contribuímos com um sistema que não muda, como se fôssemos ratos correndo numa roda, sem sair do lugar.
Minha experiência com a cartilha
Como já comentei antes, não sou herdeira. Sou filha de mãe solo e cresci em uma realidade simples, como a maioria dos brasileiros. Conquistei uma bolsa para cursar odontologia, trabalhava de dia, estudava à noite e enfrentava quatro horas de condução diariamente — ônibus, trem, caminhada e o fretado para o telemarketing.
Mesmo 13 anos após me formar, ainda considero aqueles cinco anos como os mais difíceis da minha vida. Foram tempos de muita luta, grandes responsabilidades e o sonho de alcançar uma vida melhor financeiramente.
Hoje, percebo que gastei os melhores anos da minha juventude correndo atrás do vento, seguindo um roteiro que não me trouxe segurança financeira nem o conforto esperado. Eu poderia ter vivido mais, feito um mochilão, ou simplesmente aproveitado minha vida em vez de esperar que ela começasse após uma carreira consolidada.
A importância de parecer e ostentar
Falo tanto sobre a cartilha porque, sempre que alguém foge dela, é visto como estranho ou irresponsável. Trabalhar em casa, por exemplo, raramente é considerado um trabalho de verdade. Isso se agrava em locais como onde moro, em São Paulo, onde predomina a cultura do ter, parecer e ostentar.
Não importa se você tem estabilidade financeira; se não aparenta ter dinheiro, será julgado. Eu prefiro viver de forma discreta. Não sou rica, mas não passo necessidades. No entanto, só por não atuar na minha área de formação e trabalhar vendendo comida de casa, algumas pessoas já fazem suposições sobre minha situação financeira. É aí que surgem as mensagens com links de emprego e as perguntas se estou mesmo trabalhando, entendo que não fazem por mal, como citei antes é a cartilha enraizada.
Encontrando o melhor caminho
Hoje entendo que não vale a pena seguir uma cartilha que não me representa. Prefiro viver com liberdade: viajar quando tenho vontade, abrir meu negócio no meu ritmo, cuidar da saúde, almoçar com uma amiga no meio do dia.
Para mim, essa liberdade tem mais valor do que seguir regras impostas por um sistema falido. Contudo, reconheço que há quem se sinta realizado seguindo esse caminho tradicional, e isso também é válido. Cada um tem o seu processo.
No meu caso, me encontrei fazendo o oposto: trabalhando de casa, viajando, fazendo mochilões e criando conteúdo para o YouTube no meu canal. Me sinto muito melhor assim. Por isso, não volto ao sistema antigo apenas para agradar quem ainda vive preso à cartilha que, para mim, não funciona mais.
Não deixe de conferir como fiz minha transição de carreira clicando aqui!